À segunda vista

Quando não tive papas na língua, falei

Quando estava ocioso, assaltei

Quando tive frio, camisolão usei

Quando tive coragem, liguei

 

Quando chegou a carta, queimei

Quando ouvi Queen, rockei

Quando o olho fechou, fechei

Quando criei asas, voei

 

Quando me chutou, eu vim

Quando eu estava ali, fiquei

Quando achei que tinha achado, perdi de novo

Quando vi você, eu xonei

 

Arrama a saia do cê

Ôia a saia

A saia

A amarra a saia aí sô

Ô língua dura!

 

Daí é só repetir tudo de novo

Na negativa

E fica tudo bonito!

 

Tequila

Nunca fui ao Guarujá

Nem a Barcelona

Nem a Marte

E muito menos a Júpiter

 

Estava considerando umas idas

Dessas

Qualquer dia

Desses

 

Porque se para ir

Desse

Eu até que ia

Sabe?

 

Parece conversa de gente louca

Eu sei

Mas fique tranquilo

É apenas uma questão de

Tequila

 

Quanto mais você aproveita

Mais você tem

Imaginação

Coragem...

Pessoas desinteressantes

Ficam bonitas

Seu chefe torna-se

Seu subordinado

 

E você fala o que quer

E não se importa

Porque dentro de si

Você tem o seu reinado

 

E sim, há tequila

Como se não houvesse amanhã

 

Porque a tequila

É um ingrediente amolecedor das forças psíquicas

Que com o climinha brasileiro

 

Ah! Cai tão bem..

 

Fotógrafo: Fernando Andrade

MPB

Caminhando contra o vento

Sem lenço

Nem documento

 

Mentira!

 

Essa música é do Caetano e ele é rico

Muito rico

 

É um artista rico

Ricamente enricado enricadecimaente

Rico

 

Muito requintado

Hoje usa óculos

E não canta mais todo suado

Com Gil sem camisa ao seu lado

 

Gil virou ministro

E a Preta...

A Preta arrumou problemas

Com o estado

 

E tem o Chico

O nosso velhinho tarado

Desfila em Copacabana

Sempre com o mulheril bem sarado

 

Danado

Arrumou mais em uma semana

Tudo aquilo que em uma vida

Não terei

 

Talvez, apenas um rescaldo

Oh vinda injusta

 

Queria ser artista assim

Tão bem afortunado

Todo feliz

Todo mansinho

Todo assanhado

 

Que nem

Quem o Furacão

Quando cantava

As águas de Março

 

Pois bem, nem chegou o verão

E as águas já vieram

 

Será que em breve todos levados para Elis?

João Henrique

Destinação

 Vivências são vívidas

Carências são ardentes

A vida é inflexível

O resultado é maledicente

 

Quem vive do passado

É nostalgia

Quem vive do futuro

É ansiedade

Quem está no presente

É só alegria

 

Ribombam os tufões

Rufam os tambores

Grasnam as aves

Estranham

Vivenciam as criaturas

Medonhas

 

Que fim terá tido

Aquele que em vícios

Viciou-se

Aquele desnaturado

Que em melancolia

Afogou-se

Aquele taciturno

Que do despenhadeiro

Despedaçou-se

Aquele moribundo

Que no fim de tudo

A Deus renegou-se

Aquele endiabrado

Que insatisfeito

Nunca emendou-se...

 

Agora estão todos juntos

Fotógrafo: Daniel Jensen

Vivendo em dois mundos

Saindo do meu corpo

Vi pessoas

Cometas

E dragões

 

Vivendo em meu corpo

Vi pessoas

Carros

E canastrões

 

Saindo de meu corpo

Vi animais

Planetas

E furações

 

Vivendo em meu corpo

Aprendi que sou

Parco

Que a vida é efêmera

 

Saindo do meu corpo

Vi que sou eterno

Que faço parte do todo

Que sou um com Deus

 

Que sou com o Todo

 

Vivendo em meu corpo

Aprendi que viver é difícil

É preciso ter paciência

É necessário ser disposto

 

Saindo de meu corpo

Está tudo bem

Tudo faz sentido

Porque moro no além

 

Vivendo em meu corpo

Estou no claustro da carne

Na preguiça e na melancolia

No desgaste, vivendo à parte

 

Saindo de meu corpo

Entendi que tudo é interessante

Que a vida é bela

Que estou cercado de Deus

Que tudo em mim se revela

 

Saindo de meu corpo

Eu vi que sou eterno

 

FOTÓGRAFO: GREG RAZOKY

 

#poesia #poema #poetry #poem

Palavras

Palavras

Palavras são como água

Escorrem pelas mãos

Palavras são como o ar

Acalentam os pensamentos

Palavras são como o fogo

Queimam o coração

Palavras são como a terra

Firmam os pés no chão

 

Palavras são deslizantes

Palavras são profícuas

Palavras são delirantes

 

Palavras causam medos

E arrepios

Palavras seduzem os inocentes

Ganham eleições

Mas induzem a coisas reluzentes

 

Palavras são singelas

Palavras criam filmes

E problemas matemáticos

O universo é formado por palavras

 

Por buracos negros, por planetas, por estrelas

Por palavras que explicam

Buracos negros, planetas e estrelas

 

Se não fossem as palavras nada disso existiria

Não haveria nomes

Seria tudo inominável

 

Tudo inexistente

Tudo em um banho de luzes e formas

De sol a sol

De luz à poente

 

Disse-se: “faça-se a luz”

E a luz existiu

E todo o resto

 

A palavra é criadora

A emancipação é criadora

Quando se aprende uma palavra

Uma nova realidade existe

 

Uma nova forma de expressar a criação

A existência

O inominável

O verbo

O verbo que nos tangencia

Que nos programa

E nos recria

 

O verbo que diz aquilo

Que somos

De onde viemos

E para onde vamos

 

Quem somos?

Somente as palavras dirão

 

Para onde iremos?

Somente as palavras dirão

 

Quando formos um com o Verbo Eterno

Fotógrafo: Andreas Fickl

Obscuridade

Ludibriando a morte

Ludibriando a realidade

Ludibriando as pessoas

Ludibriando a si próprio

 

O único jeito de se existir

É sendo a si próprio

Do próprio jeito

Do próprio ócio

Do ofício

E do opróbrio

 

É sendo o que se é

Que se existe

Que se pensa

Que se se sente

Que se manifesta

 

É pensando em matar que se mata

É pensando em roubar que se rouba

É pensando em se conectar que se conecta

 

Se conecta pelo mundo sendo o que se é

Se conecta com as pessoas certas

Porque é o que se é

Não se existe de outra forma

Porque outra forma não seria possível

O que é possível é a solidão

Até os confins da compreensão

De que não se trata

De nada além de compreensão

 

Que tudo são formas

E que nada é escuridão

📷 Mahdi Rezaei