Eu era poeta
Não, não era
Eu escrevia poemas e poesias
Malabarismos com palavras fazia
Mas não era poeta
Eu era um bêbado, um boêmio, um trôpego
Escrito à luz do vinho
Que bebia a noite
E vomitava à lua
À rua me tornava
A rua me tornei
Em mansidão entranhada
O amor me tornei
Amava minha vida
Me amava quem era
As mulheres, os cigarros, a bebida
A ansiedade...
Tudo eu era
E nada me tornei
O que então eu sei?
Apenas que nada sei
Que nada era
Na vida em que fui rei
Fui vários nessa vida
Mais boêmio, mais sôfrego, mais ilustre
Pedestre, caminhante em direção ao nada
Que é o tudo
Que no luto diário me aflige
De tal forma que o peito rasgue
Ainda penso nela...
E isso tanto me persiste
Mas assim é a vida
De peito em riste
Eu a enfrento
Com poesia e lamento
Com poema arrebento
A solidão diária
Que relato solidário
Ao escravo, ao trabalhador, ao operário
Ao livre servo
Que seu pranto desterra
Que a poesia exalta
E tudo em volta
Transforma, expande e a vida encerra
Resplandecendo
Como no copo de poesia embebido
No sol do meio dia
Com cachaça regada ao gosto de trabalho
Com sabor de rescaldo
Com sabor de poesia
Em sopa de azia
Eu era poeta
Juro! As palavras construía